O Ministério Público Federal (MPF) obteve a condenação do ex-prefeito de Uberaba, Anderson Adauto (gestão 2009-2012), por improbidade administrativa decorrente de irregularidades praticadas com recursos do Ministério da Saúde. Ele teve os direitos políticos suspensos por oito anos.
Também foi condenada a empresa Farmácia Acqua Bella, que, na época dos fatos, seria de propriedade de uma ex-servidora municipal.
De acordo com a ação, proposta pelo MPF em 2016, o então prefeito, sob o pretexto de atendimento a ordens judiciais, editou três decretos municipais sucessivos, em caráter emergencial, autorizando a aquisição de medicamentos de toda e qualquer natureza, excepcionais ou não, com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS).
O primeiro decreto (nº 4.512) foi assinado em 5 de setembro de 2008, com vigência de três meses; o segundo (nº 4.731), em 30 de dezembro de 2008, prorrogava a vigência do primeiro por mais três meses; o terceiro (nº 219), assinado em 13 de março de 2009, estendia a vigência por outros 60 dias.
Os decretos autorizavam a dispensa de licitação para a compra de medicamentos, ao fundamento da necessidade de se atender ordens judiciais, embora seu texto fosse absolutamente genérico, sem especificar os medicamentos e os respectivos destinatários. Outro argumento utilizado pelo ex-prefeito ao expedir os decretos era o de que os prazos despendidos na licitação “causariam transtornos aos princípios e finalidades públicas” e, que, por isso, far-se-ia necessária a aquisição emergencial dos medicamentos.
Mas o fato é que, apesar de emitir declaração de situação emergencial para afastar a obrigatoriedade de licitação, o ex-prefeito ainda levou seis meses para simplesmente autorizar o procedimento de dispensa. Isso ocorreu somente em 3 de março de 2009, ou seja, quando já estava quase terminando a vigência do segundo decreto, o que levou à edição do terceiro decreto estendendo a vigência até 13 de maio de 2009.
Autorizado em março, com valor estimado de R$ 420 mil, o procedimento ainda levaria outros quatro meses para ser finalizado, em 6 de julho de 2009, com a assinatura do respectivo contrato para aquisição dos medicamentos. Ocorre que, como o prazo de vigência do Decreto 219, que autorizava tal procedimento, havia terminado em maio, evidentemente que qualquer ato dele resultante seria nulo. Para burlar essa circunstância, o contrato, assinado em julho, dispôs que sua vigência se daria a partir de 11 de março.
Falso recebimento – A sentença afirma que o decreto e o correspondente Processo de Dispensa de Licitação tiveram o “nítido propósito de ‘legalizar’ negócio implementado dois meses antes com a farmácia corré”.
Isso porque, em janeiro daquele ano, a Prefeitura já havia “adquirido” os medicamentos da Farmácia Acqua Bella, conforme consta de 17 notas fiscais emitidas pela empresa e atestadas e pagas pelos órgãos municipais. Ou seja, recursos públicos do SUS foram destinados a essa empresa antes mesmo da realização do procedimento de dispensa, que consiste basicamente na realização de pesquisa de mercado para a obtenção de fornecedor que ofereça os menores preços à Administração Pública.
Ou seja, grande parte das notas de empenho e das notas fiscais relativas às aquisições de medicamento foram emitidas antes mesmo da assinatura do contrato que as autorizaria. Em alguns casos, as próprias notas de empenho – documento expedido pela Administração Pública autorizando a compra dos produtos – foram emitidas depois da quitação das notas fiscais relativas àquelas mercadorias.
As irregularidades também aconteceram com relação à saída dos produtos da fornecedora: auto de infração lavrado pela Secretaria da Fazenda do Estado de Minas Gerais noticiou que embora tenha sido registrada a saída de 120 mil comprimidos do fármaco Ibuprofeno 200mg com destino à Prefeitura de Uberaba, na verdade, a Farmácia Acqua Bella sequer possuía esse medicamento em estoque. Em consequência, as notas fiscais relativas a essa transação também apresentaram desconformidades, tendo sido emitidas manualmente em 5 de janeiro, 52 dias antes da obtenção da respectiva Autorização de impressão de Documento Fiscal (autorização foi concedida pelo fisco estadual em 26 de fevereiro de 2009).
Mais grave, porém, é o fato de que a maior parte dos remédios nunca foi entregue ao setor de materiais médico-hospitalares da Secretaria Municipal de Saúde.
Em depoimento ao MPF, o servidor municipal então responsável pelo setor afirmou que, apesar de nunca terem constado dos estoques municipais, as mercadorias foram dadas como recebidas, mas não pela Comissão de recebimento de materiais, e sim por servidores do Setor de Requisições e Contratos.
Para o Juízo Federal, os fatos indicam a “perpetração de negociata entre os réus, com vistas à obtenção de vantagem espúria”, com o ex-prefeito forjando a suposta situação de emergência, inclusive com prazo superior ao limite legal de 180 dias, e autorizando a contratação, sem licitação, da Farmácia Acqua Bella, que se beneficiou dos atos de improbidade administrativa do agente político.
Sanções – Anderson Adauto e a pessoa jurídica Farmácia Acqua Bella foram condenados, solidariamente, a restituir aos cofres públicos o valor de R$ 178.212,48 acrescido de juros e correção monetária, e ao pagamento de multa civil em igual valor e sob as mesmas condições de atualização monetária.
(ACP nº 4636-25.2016.4.01.3802)
Fonte: Assessoria de Comunicação Social Ministério Público Federal em Minas Gerais.